Com a barriga cheia, os dois amigos foram dormir. Durante a noite, a temperatura caiu bruscamente; Colossos, com seus espessos pelos, já estava adaptado ao frio; Ravi, no entanto, encarangava; o queixo batia em oscilações constantes. O Panda, ao perceber o incômodo da criança, sugeriu que os dois dormissem juntos. Abraçado ao garoto, usou o calor de seus pelos para aquecê-lo. Protegido pela criatura negra, sonhou em suavidade. Ao acordar, parecia sentir a imagem da mãe; embora não lembrasse, teve a certeza de a ter encontrado em sonhos.
Partiram com as primeiras nesgas de luminosidade. Percorreram uma longa planície. A medida que andavam, as árvores dispostas ao longo da floresta ficavam ainda maiores; os cogumelos coloridos, imperceptíveis no início da floresta, já tinham o tamanho de um homem adulto. O som da atmosfera era estridente, quase insuportável; mosquitos gigantes passavam zunindo; formigas monstruosas laboravam carregando folhas; centopeias e caramujos se alimentavam deixando um rastro gosmento pelo caminho. Ravi via tudo com temor e admiração. A pujança de todas aquelas formas desvelavam o poder da natureza.
"A medida que adentramos a floresta, tudo fica maior. Se não estivesse ao seu lado, não conseguiria percorrer tamanha distância. Talvez fosse devorado por estes insetos."
"Não tenha medo. A natureza às vezes tenta demonstrar aos novos visitantes sua grandiloquência; mas quando faz isso é por pura soberba. Perto dessa vegetação mesmo eu, a aterrorizante criatura negra, me sinto pequeno. Mas nem sempre é assim, tem dias que percorro estas verdes planícies sem enxergar nada que ultrapasse os meus joelhos. A natureza, por alguma razão, está se exibindo; deve ter sentido sua presença e sua pureza de espírito."
"As coisas mudam de tamanho neste lugar?"
"Sim. Alguns povos dizem que esta floresta é encantada; que existe um espírito que amolda o ambiente, modifica suas formas; deixa tudo maior ou menor, reto ou distorcido, claro ou escuro. Está escutando estas vozes? São cantos lamuriosos da natureza. Quando meus pais morreram e os últimos da minha espécie me deixaram sozinho, mudei pra cá; esta floresta é temida por todos; como ninguém se arrisca a enfrentá-la, sinto-me seguro aqui. Tem dias que converso com o espírito da floresta, que eu prefiro chamar de natureza. E ela como eu também se confrange em solidão. Já me acostumei com ela, com suas dores lancinantes e seus gritos de tormenta."
"Mas por que ela sofre? E onde podemos encontrá-la, as vozes parecem vir de todas as direções."
"Ela é a floresta, está em todos os lugares; em cada árvore, folha, inseto; em cada partícula de ar que respiramos. Alguns dizem que ela era uma lagarta que ao virar borboleta assumiu o controle de tudo, fazendo de todos servos; prisioneiros de suas lamúrias. Não sei por que ela sofre; mas nem sempre os cânticos são tristonhos; têm dias que ela está alegre e suas elegias se convertem em belas odes capazes de transformar em felicidade qualquer pensamento. Hoje as vozes estão sombrias, parece que algo a incomoda, que alguma coisa se encontra fora do lugar."
"Se eu pudesse, ajudaria. Mas tenho que voltar pra casa. Meu pai deve estar preocupado com meu sumiço."
"Você pode ajudá-la. Se não tiveres medo, acho que ela se alegrará. A natureza é bastante sensível e seu temperamento obedece ao espírito de quem a contempla."
As palavras de Colossos, sensibilizaram o menino; sua desconfortável sensação se arrefeceu. Aos poucos tentava transmitir carinho e compreensão aos lamentos que escutava. Não queria que a natureza se entristecesse com sua presença. Mentalizou suas melhores lembranças; e novamente a figura da mãe voltou a apaziguar seus ânimos.
Um pouco mais à frente, avistaram uma grande árvore, a maior e mais bela de todas. Seu tronco tinha uma grossura colossal. Era frondosa e suas folhas brilhantes, ela lembrava o sol; a luz que emanava era tão forte que cegava os olhos. Várias cavidades pendiam por toda sua superfície. Cada uma delas era um imenso casulo. Os gritos da natureza, percebendo a aproximação dos dois visitantes, ficaram mais intenso; e se antes as lamúrias viam de todas as direções, agora pareciam se concentrar no interior da grande árvore. Era como se o vento chorasse plangentes canções. Os ruídos despertavam as mais recônditas dores e os mais inefáveis sofrimentos. Estáticos a contemplar tamanho fenômeno natural, viram os casulos se abrirem e de dentro deles dezenas de borboletas encontravam a vida. A medida que os animais rompiam as amarras dos casulos, os gritos de horror anunciavam alívio. O espetáculo era grandioso; as borboletas, cada qual com asas das mais diversas cores, ganhavam os ares numa experiência visual inimaginável. O espírito da floresta, já sem força, aos poucos, se silenciava. Quando o último casulo foi rompido, uma imensa paz suavizou os ruídos do ambiente. Ravi e Colossos se entreolharam sem acreditar naquilo que os olhos viam; ambos estavam absortos pelo vórtice de sensações que aliviavam seus pensamentos. As brilhantes folhas se apagaram e um silvo de alegria foi ouvido.
"Então era isso, a natureza não estava triste, apenas gritava em dores. Por isso seus gritos eram tão belos; anunciavam a vida, o nascimento" - disse o menino ainda absorvido pela atmosfera inebriante do acontecimento.
"Durante todos esses anos na floresta, nunca tinha presenciado este fenômeno tão lindo. Talvez a natureza não quisesse que eu, sozinho, interrompesse sua mágica de vida. No entanto, ao seu lado, ela me concedeu esta dádiva."
"Então, o espírito da floresta é na verdade esta imensa árvore luminosa."
"Não se precipite, pequeno Ravras. Não queira personificar num objeto aquilo que lhe proporcionou beleza. O espetáculo que presenciamos nada nos diz sobre a existência material do espírito da floresta."
Como se a natureza quisesse confirmar as interpretações de Colossos, um cântico suave adornou a atmosfera. O espírito estava feliz, e suas canções não saiam da imensa árvore, mas, como antes, vinham de todas as direções.
"Tem razão. O espírito da floresta talvez seja o todo; as árvores, o solo, os animais, o ar que respiramos. Talvez ela esteja dentro de mim e de você."
Neste momento, uma das borboletas que acabara de nascer pousou sobre os ombros de Colossos. Olhou para Ravi, abrindo suas imensas asas de coloração alaranjada. O menino não teve medo. Algo parecia sair dos contornos coloridos do belo inseto; e sem saber se aquele animal falava ou se o som vinha de outra direção, ouviu, em voz feminina, um singelo conselho. "Só você saberá o caminho". A borboleta tomou os ares e novamente o garoto lembrou da mãe. Guardou as palavras consigo. Aparentemente Colossos nada ouvira.
Um pouco mais à frente, avistaram uma grande árvore, a maior e mais bela de todas. Seu tronco tinha uma grossura colossal. Era frondosa e suas folhas brilhantes, ela lembrava o sol; a luz que emanava era tão forte que cegava os olhos. Várias cavidades pendiam por toda sua superfície. Cada uma delas era um imenso casulo. Os gritos da natureza, percebendo a aproximação dos dois visitantes, ficaram mais intenso; e se antes as lamúrias viam de todas as direções, agora pareciam se concentrar no interior da grande árvore. Era como se o vento chorasse plangentes canções. Os ruídos despertavam as mais recônditas dores e os mais inefáveis sofrimentos. Estáticos a contemplar tamanho fenômeno natural, viram os casulos se abrirem e de dentro deles dezenas de borboletas encontravam a vida. A medida que os animais rompiam as amarras dos casulos, os gritos de horror anunciavam alívio. O espetáculo era grandioso; as borboletas, cada qual com asas das mais diversas cores, ganhavam os ares numa experiência visual inimaginável. O espírito da floresta, já sem força, aos poucos, se silenciava. Quando o último casulo foi rompido, uma imensa paz suavizou os ruídos do ambiente. Ravi e Colossos se entreolharam sem acreditar naquilo que os olhos viam; ambos estavam absortos pelo vórtice de sensações que aliviavam seus pensamentos. As brilhantes folhas se apagaram e um silvo de alegria foi ouvido.
"Então era isso, a natureza não estava triste, apenas gritava em dores. Por isso seus gritos eram tão belos; anunciavam a vida, o nascimento" - disse o menino ainda absorvido pela atmosfera inebriante do acontecimento.
"Durante todos esses anos na floresta, nunca tinha presenciado este fenômeno tão lindo. Talvez a natureza não quisesse que eu, sozinho, interrompesse sua mágica de vida. No entanto, ao seu lado, ela me concedeu esta dádiva."
"Então, o espírito da floresta é na verdade esta imensa árvore luminosa."
"Não se precipite, pequeno Ravras. Não queira personificar num objeto aquilo que lhe proporcionou beleza. O espetáculo que presenciamos nada nos diz sobre a existência material do espírito da floresta."
Como se a natureza quisesse confirmar as interpretações de Colossos, um cântico suave adornou a atmosfera. O espírito estava feliz, e suas canções não saiam da imensa árvore, mas, como antes, vinham de todas as direções.
"Tem razão. O espírito da floresta talvez seja o todo; as árvores, o solo, os animais, o ar que respiramos. Talvez ela esteja dentro de mim e de você."
Neste momento, uma das borboletas que acabara de nascer pousou sobre os ombros de Colossos. Olhou para Ravi, abrindo suas imensas asas de coloração alaranjada. O menino não teve medo. Algo parecia sair dos contornos coloridos do belo inseto; e sem saber se aquele animal falava ou se o som vinha de outra direção, ouviu, em voz feminina, um singelo conselho. "Só você saberá o caminho". A borboleta tomou os ares e novamente o garoto lembrou da mãe. Guardou as palavras consigo. Aparentemente Colossos nada ouvira.
FG
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