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Camões vs. Gonçalves Dias - um duelo aos olhos verdes




Redondilha de Camões

Menina dos olhos verdes
Por que me não vedes?

Eles verdes são,
E têm por usança
Na cor esperança
E nas obras não
Vossa condição
Não é de olhos verdes,
Porque me não vedes.

Isenção a molhos
Que eles dizem terdes,
Não são de olhos verdes,
Nem de verdes olhos.
Sirvo de geolhos,
E vós não me credes,
Porque me não vedes.

Havia de ser,
Por que possa vê-los,
Que uns olhos tão belos
Não se hão de esconder.
Mas fazeis-me crer
Que já não são verdes,
Porque me não vedes.

Verdes não o são
No que alcanço deles;
Verdes são aqueles
Que esperança dão.
Se na condição
Está serem verdes,
Por que me não vedes?

(poema retirado do livro Lírica Redondilhas e Sonetos de Camões da editora Ediouro)


Olhos Verdes de Gonçalves Dias

São uns olhos verdes, verdes,
Uns olhos de verde-mar,
Quando o tempo vai bonança;
Uns olhos cor de esperança
Uns olhos por que morri;
Que, ai de mi!
Nem já sei qual fiquei sendo
Depois que os vi!

Como duas esmeraldas,
Iguais na forma e na cor,
Têm luz mais branda e mais forte.
Diz uma - vida, outra - morte;
Uma - loucura, outra - amor.
Mas, ai de mi!
Nem já sei qual fiquei sendo
Depois que os vi!

São verdes da cor do prado,
Exprimem qualquer paixão,
Tão facilmente se inflamam,
Tão meigamente derramam
Fogo e luz do coração;
Mas, ai de mi!
Nem já sei qual fiquei sendo
Depois que os vi!

Como se lê num espelho,
Pude ler nos olhos seus!
Os olhos mostram a alma,
Que as ondas postas em calma
Também refletem os céus;
Mas, ai de mi!
Nem já sei qual fiquei sendo
Depois que os vi!

Dizei vós, ó meus amigos
Se vos perguntam por mi,
Que eu vivo só da lembrança
De uns olhos da cor da esperança,
De uns olhos verdes que vi!
Que, ai de mi!
Nem já sei qual fiquei sendo
Depois que os vi!

Dizei vós: Triste do bardo!
Deixou-se de amor finar!
Viu uns olhos verdes, verdes,
Uns olhos da cor do mar;
Eram verdes sem esp’rança,
Davam amor sem amar!
Dizei-o vós, meus amigos,
Que, ai de mi!
Não pertenço mais à vida
Depois que os vi!

(poema retirado do livro Literatura Brasileira de Willian Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães da editora Atual)



Comentários

  1. Quantas vezes tivemos nós mesmos os olhos verdes, verdes da esperança que na verdade não demos (ao outro)... Outras tantas vezes, os olhos verdes foram de outra pessoa... que nada de esperança nos deu... Será que me fiz entender?

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    Respostas
    1. Resolveu comentar todos os textos? Que bom.
      O pior é quando os olhos verdes brincam com a esperança; é difícil detectar neste olhos a perversa ironia ou o insidioso sarcasmo.
      Valeu maninha (eu nunca te chamei assim) pelo delicado comentário

      Excluir
  2. Esse espírito romântico... uau... não conhecia... Um sentimentalismo escondido... Quem tá aí? Querendo sair? Acho que as palavras escritas estão abrindo uma porta do auto conhecimento... Sensacional!!!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Estou longe e ao mesmo tempo perto do romantismo, é difícil encontrar nas palavras belas qualquer significado, elas foram feitas para os sentimentos nobres, mas quando fracassam despertam as sombras obscuras de locais desumanos. Acho que não disse nada; tenho esta estranha mania.

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  3. recebi este poema !!! uauu

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