Fazendo uma análise jocosa das três partes anteriores, percebi em meus textos uma certa propensão ao ridículo; mesclando subjetivismos e clichês, transformei comentários em emaranhados de palavras confusas e desinteressantes; entre o distanciamento pseudo erudito, confidências plangentes e a análise burocrática iniciei um estilo novo, inovador e vergonhoso. Meu orgulho e originalidade ficam armazenados, presos em meu sub-consciente, esperando, em estado latente, a oportunidade para anunciar ao mundo minha índole irônica de fracassado. Sempre ansiei a imoralidade, quis de todas as formas homenagear o ímpio, o vil, o reles; porém minha criação cristã e minha personalidade comedida nunca permitiram o menor desviu. Tenho, infelizmente, um ótimo coração, sou correto, bom samaritano, incapaz de machucar meu maior inimigo; sempre, à semelhança da imensa maioria, irei carregar a cruz do homem comum, bem comportado, e por mais que eu tente o contrário, serei - mesmo mudando o visual, a cor dos meus cabelos, a entonação da minha voz, meu humor ou estilo - prosaico, conservador e invisível.
Alguns poetas tentaram me animar, muitos vieram aos meus ouvidos e sussurraram palavras reconfortantes. Hoje, em estado de graça, contente com a consciência cáustica do meu sofrimento, dou risada sozinho à frente do espelho, ou isolado sobre as quatro paredes do meu quarto. Na frente dos outros jogo charme, tento, com um sorriso melancólico no rosto, seduzir objetos, conquistar qualquer tipo de atenção depreciativa, ou, então, simular pedacinhos singelos e nostálgicos de vazio. Sem precisar chorar, finjo sofrer, pois Leminski me ensinou que um homem com uma dor é muito mais elegante. Sendo assim, entre a mentira e a deselegância, prefiro e escolho a primeira. Sinceramente, se, a partir de agora, nada me fizer mal, inventarei, como de praxe, algum tormento.
Não sei se posso postar um vídeo de pessoas desconhecidas no meu blog, mas como ele estava publicado no youtube, considerarei a opção válida, aliás, fiquei com inveja daquelas pessoas, gostaria de conhecê-las apenas para dizer: "vocês são tão belas".
41. Dançando no Escuro - Lars Von Trier - 2000
Grande vencedor da Palma de Ouro do longínquo ano de abertura da década passada, Dançando no Escuro é um musical às avessas; em lugar das cores, do enredo leve e otimista, temos um drama denso, melancólico quase nauseante. Protagonizado pelo rosto e pela voz incomum da islandesa Björk, o filme inova ao amplificar o alcance do gênero. Filmado por câmeras digitais e pelas mãos do próprio diretor, a sensação visual, a princípio, é bastante incomum; para os olhos mais sensíveis, assistir ao filme, tanto pelo roteiro - pesado, quase vulgar - quanto pela proposta formal, pode ser um desafio. O drama social enfrentado pela protagonista, imigrante do leste europeu, junto à sua doença hereditária que aos poucos retira sua visão, apenas intensifica sua trajetória trágica no território americano. De certa forma, a película antecipa as veementes críticas de Trier à sociedade estadunidenses que viriam anos depois com Dogville, sua obra mais famosa.
40. Lady Vingança - Chan-wook Park - 2005
Não acredito, quando fui publicar esta nova postagem meu computador travou, perdi o comentário desta e da próxima obra, só não perdi tudo porque de 20 em 20 minutos o blogger salva automaticamente os textos, vídeos e imagens. Detesto reescrever algo terminado, mas serei, mesmo furioso, obrigado a fazer isso; até agora não me conformo, pois é sempre um alívio chegar ao fim, colocar o último ponto final, e me desvincular das palavras inúteis deglutidas e vomitadas.
Feito a observação, vamos ao comentário. Terceiro filme da trilogia da vingança do sul coreano Chan-wook Park, Lady Vingança é a obra mais bem acabada do diretor. Todos os planos e sequências seguem o rigor e o perfeccionismo que tem, nos últimos anos, caracterizado o cinema asiático. Formalmente impecável, já no prelúdio somos instigados a apreciar a beleza das imagens; com tons claros e vibrantes as cenas iniciais antecipam o encantamento que nos acompanhará durante toda a projeção. No entanto, não é apenas a estrutura formal que qualifica a película, o roteiro não linear, o rosto angelical da protagonista, e as reflexões morais propostas principalmente nos minutos finais, dão ao filme a ambiguidade perfeita para, aos poucos, desvelar a violência psicológica implícita em toda a narrativa.
Sobre o enredo, é escusado dizer que trata-se de uma obra sobre a vingança; menos imaginativo e explícito do que os anteriores, este é o trabalho de Park que, muito em consequência das discussões sociais e políticas sugeridas, deu ao tema o maior alcance.
39. Cão Sem Dono - Beto Brant - 2007
Devo confessar que me identifico profundamente com Ciro, o protagonista do filme. Jovem solitário, vive sozinho, mas, pela dificuldade de conseguir emprego ou alguma ocupação como tradutor, depende sistematicamente da ajuda financeira de seu pai. Nosso herói desenvolve, ao longo da trama, um relacionamento sério com a estonteante modelo Marcela, personagem interpretado pela belíssima Tainá Müller, criando, mesmo sem perceber e em razão do vazio da sua própria existência, uma dependência desproporcional por ela. Com a separação, Ciro entra em desespero, Marcela, de certa forma, era o único recheio da sua vida; o afastamento, antes de ser o símbolo do amor que vai embora, significaria a retomada do vazio interno contingencialmente camuflado pela presença da mulher. A placides das relações sociais e familiares mostradas no filme escancara os dilemas e sofrimentos da classe média brasileira, ao contrário da abordagem mais social e política encontradas em filmes populares como Cidade de Deus e Tropa de Elite, a adaptação do romance de Daniel Galera procura discutir algo pouco explorado pelo nosso cinema. Poucas vezes assisti um filme com um enfoque tão cru da solidão, do vazio, da dependência e da inexpressividade; Beto Brant, em seu melhor trabalho, foi perfeito
FG
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