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Mostrando postagens de setembro, 2012

Inimigos: Uma História de Amor - Isaac Bashevis Singer

Este, se não falha minha memória, é o primeiro livro de literatura iídiche que me deparei. Uma rápida pequisa na Wikipédia e descubro que o estranho idioma é falado, principalmente, por judeus ortodoxos da Europa Oriental; consiste em uma mistura do alemão com o semita e dialetos eslavos, sendo escrito da direita para a esquerda com caracteres hebraicos. Mesmo utilizando uma língua tão peculiar, o autor Isaac B. Singer teve a honra de ser laureado com o prêmio nobel de literatura no ano de 1978; natural da Polônia emigrou, ainda na década de trinta, para os Estados Unidos, publicando, neste país, a maior parte de sua obra. Mesmo não tendo vivido os horrores do holocausto, o martírio de seu povo marcou profundamente sua escrita; no próprio prefácio de “Inimigos: uma História de Amor” Singer comenta: “Embora eu não tenha tido o privilégio de passar pelo holocausto de Hitler, vivi durante anos em Nova York com os refugiados dessa provação”. É com este cáustico humor que as página

O Bom Gosto Artístico, parte I

Estava pensando, refletindo sobre algo aparentemente inútil; como era possível adorar, simultaneamente, obras de comprovada relevância artísticas e outros produtos parvamente realizados com o propósito exclusivo de entreter pelo viés anticultural? Não seria uma fraqueza do espírito aceitar tolices como uma maneira de aquiescência à vulgaridade que, ao animalizar o objeto, diminui a percepção e a avaliação das formas disponibilizadas aos nossos sentidos? Em outras palavras: ao consumir a enxurrada de mercadorias pseudo culturais estaríamos assumindo nossa propensão ao mau gosto? Sinceramente, acredito que tais perguntas não devem ser respondidas, sem antes definir o que seria este suposto bom gosto artístico, e como podemos relacionar nossas diversas preferências - sejam elas culturais, afetivas, amorosas, estéticas, filosóficas, culinárias, profissionais, ou políticas – objetivando estabelecer um critério com a potencialidade de adjetivar, como bom ou ruim, gostos particulares

Morte em Veneza - Thomas Mann

“Morte em Veneza” é simplesmente a melhor obra literária que li; a qualidade do texto, com frases intermináveis, estruturadas com um formalismo precioso; as reflexões epistemológicas a respeito da arte e do fenômeno estético; a paixão construída pela idealização da beleza; o ritmo narrativo suave que acompanha a própria calmaria da vida litorânea; o olhar condutor, inefável e exuberante, que nos coloca no centro da trama; são alguns elementos que transformaram a aura desta novela em algo próximo ao divino. As passagens destacadas abaixo demonstram a veracidade desta observação “ E a forma não tem ela mesma duas faces? Não é simultaneamente moral e imoral – moral, enquanto resultado e expressão da disciplina, mas imoral e até amoral na medida em que, por sua própria natureza, pressupõe uma indiferença moral, sim, e está essencialmente dedicada a vergar a moralidade, submetendo-a a seu cetro orgulhoso e absoluto?” “ Deste modo pensava Aschenbach em seu êxtase, essa era a

Bilhetinhos de Amor

O Homem das ciências Confesso, eu te amo. Esta fórmula ridícula do desejo que em qualquer situação deveria ser descartada, repudiada pela falta de originalidade, em meu caso, por favor acredite, é digna do mais altivo respeito; venho, a alguns anos, perscrutando as potencialidades amorosas advindas do encontro à fórmula estética perfeitamente adaptável ao meu espírito individual, e lhe digo: depois de cálculos ergométricos, medições mitrostásticas, análises fondoluptas, eu descobri: minha unha encravada possui uma similitude inigualável com o pus estertorante dos seus cílios capilares, ou seja, nascemos um para outro; sendo assim, lhe imploro, acredite na ciência, ela não erra nunca; e, a propósito, despreze o lirismo desta mensagem, eu não consigo censurar minha sensibilidade, ter alma de poeta é o epíteto nefando que sou obrigado a carregar ao lado de minha inteligência racionalmente superior. O Indeciso que não quer se comprometer Não digo que te amo, nem d

Versos Íntimos - Augusto dos Anjos

Vés, ninguém assistiu ao formidável enterro de tua última quimera Somente a ingratidão - esta pantera -  Foi tua companheira inseparável Acostuma-te a lama que te espera! O homem, que, nesta terra miserável, mora, entre feras, sente inevitável  necessidade de também ser fera Toma um fósforo. Acenda teu cigarro! O eijo, amigo, é a véspera do escarro A mão que afaga é a mesma que apedreja Se a alguém causa inda pena a tua chaga Apedreja esta mão vil que te afaga Escarra nesta boca que te beija! Foi apenas uma lembrança, talvez triste, mas não menos bela (retirado do livro "EU e outras poesias")  

On the Road - Jack Kerouac

“On the Road”, romance lançado no final dos anos 50, é um digno exemplar literário que inspirou gerações; repleto de aventuras sexuais, drogas e muito jazz, o impacto, quando de seu lançamento, era inevitável; batendo de frente com uma sociedade conservadora, ainda bastante apegada as tradições e preconceitos do século anterior, revolucionou a cultura e introduziu um novo estilo de linguagem. Escrito por um suposto fluxo contínuo de pensamento, levemente impulsionado por substâncias impróprias para o consumo compulsivo, este livro, o primeiro a alcançar sucesso dentro do universo conhecido, anos depois, como beat, conta a estória parcialmente verídica de Sal Paradise, personagem inspirado no próprio autor, suas viagens pelo território americano e sua onírica amizade com o ultra pirado Dean Moriarty. O ritmo da narrativa é frenético; estrada, bar, mulheres, fome, bebida, loucura, trabalho, cansaço, estudo, conversa, música, música, música.... estrada, sorrisos, camaradagem, amiz

A Morte de Iván Ilitch - Lev Tolstói

Começar afirmando a genialidade do autor russo, seria impróprio, quase redundante, tendo em vista a obviedade que ultrapassa a mera atmosfera dos clichês - marcantes nos comentários críticos de pseudo-resenhistas. Os defeitos linguísticos de um texto que afirma ser Tolstói um gênio são os mesmo que dizem que o vermelho é vermelho. Essa tautologia, recurso sincero daqueles que se setem intimidados com a grandiloquência da obra do Artista, apesar de empobrecer as observações, é válida pois separa, em esferas existenciais díspares, o gênio dos leitores contemplados pela genialidade. De início, feita a advertência, coloco estas tímidas palavras dentro do coletor de lixo reciclável, esperando que os efeitos nocivos da poluição textual deste comentário sejam, devidamente, apaziguados. “A Morte de Ivan Ilitch” trata-se não só da morte como destino inexorável do ser humano, ou da angústia gerada pelo conhecimento da finitude da vida, mas também, e sobretudo, da instrumentalizaçã

O Adolescente - Fiódor Dostoiévski

   É difícil definir este romance, posso dizer, apenas, que sua trama é falsamente complexa. Muitos personagens, com nomes estranhíssimos (afinal são personagens russos), além das variações de nomenclatura que nem sempre são informadas ao leitor, torna tudo muito nebuloso. Contudo, com um pouco de paciência, tudo se assenta, o enredo mostra-se bastante simples, e, ao final, nos deparamos com uma sincera e obscura história de amor. Temos uma gama de sentimentos abordados no livro; a ganância, o cinismo, a vaidade, o vício, o altruísmo, a abnegação, tudo o que uma bom enredo dostoiévskiano pode nos oferecer, mas é o amor que irá não só mover todas as intrigas da trama como também sedimentará a própria narrativa. Narrado em primeira pessoa, o livro desenvolve-se sobre as impressões, muitas vezes ingênuas e sentimentalmente influenciáveis, de Arkádii Makárovitch Dolgorúkii, o adolescente recém chegado a São Petersburgo que em seu âmago carregava uma “ideia” fixa, tornar-se um novo Ro

Triste Fim de Policarpo Quaresma - Lima Barreto

Tenho dúvidas de como iniciar este texto; resenhar um clássico da literatura nacional, típico livro que adolescentes são obrigados a ler no colégio, e que é cobrado em alguns vestibulares nas suas esquizofrênicas provas de seleção, exige um pouco mais de apreço e melindre com as palavras, e com as observações e os desvios temáticos que, constantemente, abatem sobre minha escrita, para que os possíveis leitores destes despretensiosos comentários possam compreender a estrutura, a forma, o enredo e as influências literárias do romance que transformou o autor Lima Barreto em estrela de livros do ensino médio. Para iniciar com tom solene, reproduzo eminente comentário de Oswaldino Cruz Vieira, ecumênico jornalista da Gazeta Popolis, jornal de maior vendagem da antiga capital federal no início do século XX. “ A pungência artística deste mulato do subúrbio carioca exortou a novos caminhos nossa literatura, rompendo com a longa tradição de aforismos brejeiros que nos últimos anos a

Crime e Castigo - Fiódor Dostoievski

O romance conta a história do jovem Raskólnikov, ex-estudante de direito que é impelido ao crime pela falta de condições materiais de existência, alicerçada à distorção interpretativa dos códigos morais que acompanhavam a evolução historicista da sociedade. O protagonista, influenciado, supostamente, pelas recentes abordagens relativistas da História, inventa uma teoria peculiar sobre o crime. Este, proibido aos indivíduos ordinários, poderia ser praticado por uma gama restrita de grandes homens, os ditos extraordinários, que, estando acima do bem e do mal, teriam a liberdade e a prerrogativa individual de criar novos padrões de conduta para justificar atos ignóbeis. Raskólnikov, a muito ultrajado pelas necessidades financeiras, descobre que sua adorável irmã, Dúnia, pretendia se unir em matrimônio ao senhor Lujin, homem de posses substâncias, para ajudá-lo a se manter em São Petersburgo e a retomar seus estudos. Aviltado existencialmente por sua condição, e na tent

Início

Todo o início é desgastante, exige um pouco de calma, mesmo quando a ansiedade é insuportável. Começo este blog com um objetivo modesto, apenas pretendo armazenar texto e pequenas resenhas literárias dos livros que tenho o prazer de ler; caso eu seja o único a acessá-lo, e isto é bastante provável que aconteça, não me incomodarei. Como dito, este será um espaço para manter meus arquivos de dados a salvo da intemperes do meu desgastado HD. Para iniciar em grande estilo, deixo postado uma belíssima poesia de Drummond OS OMBROS SUPORTAM O MUNDO Chega um tempo que não se diz mais: meu Deus Tempo de absoluta depuração. Tempo em que não se diz mais: meu amor. Porque o amor resultou-se inútil. E os olhos não choram. E as mãos tecem apenas o rude trabalho. E o coração está seco. Em vão mulheres batem à porta, não abrirás. Ficaste sozinho, a luz apagou-se, mas na sombra teus olhos resplandecem enormes. És todo certeza, já não sabes sofrer. E nada espera de teus amigos. Pouc