Sempre sonhei em escrever. Mais do que uma frase, ou sentença. Queria escrever um parágrafo, uma ideia; talvez uma página, um capricho. Duas palavras, após um testemunho. Quem sabe um conto, uma novela, um livro.
Sempre sonhei com papéis. Mais do que isso, com a tinta. Queria folhear algo meu; não aquilo que apenas eu manuseio. Queria também outras mãos perto das minhas, bisbilhotando palavras daquilo que sonhei. Quem sabe uma frase, um parágrafo, uma ideia. Se fosse um livro, de poucas páginas, mas um livro; quantas mãos seriam aquelas? Quantos pensamentos? Quantos gritos? E os sussurros?
Sempre sonhei poesia. Mas poesia sem palavra. Poesia de silêncio. Poesia que se diz sem som, que se compreende sem voz alguma. Poesia que vem de dentro e não vai embora. Não qualquer uma, daquelas que nascem resplendorosas. Outro tipo de poesia. Um tipo de poesia que não se conhece. Um tipo de poesia não escrita. Um tipo de poesia densa, dura, impenetrável. Um tipo de poesia muito cheia e, ao mesmo tempo, vazia.
Sempre sonhei. Desta forma. Com a escrita, com a poesia. Sempre sonhei. O sonho de uma frase, do capítulo. O sonho de duas palavras que preenchessem uma grande ideia. Sempre sonhei o sonho de um livro. Não de um livro qualquer. Mas de um livro desenhado. Desenhado em silêncio. Com o meu silêncio. Sempre sonhei esse sonho. O sonho das mãos que me tocam, das mãos que me acariciam.
E por ter sonhando tanto, por ter tido tantos sonhos, sonho de linguagem, sonho de carinho, fiquei mudo, contemplativo. Também fiquei estranho. Não estranho do jeito que sempre fui. Mas estranho de outro jeito. De um jeito delicado, bruto. Fiquei estranho de estranheza. Uma estranheza de se ver ao contrário. De se ver ao contrário sem espelho. De se ver ao contrário daquela forma estranha. De uma forma que causa estranheza.
Assim, ao avesso, já não sei mais se sonhei, ou se tive um sonho.
FG
Comentários
Postar um comentário