Pular para o conteúdo principal

Aventuras de Ravi - XXX

Bleu escreveu a petição. Seu texto era fluído e convincente, porém não sabia como provar a indispensabilidade de Ravi junto aos cogumelos. Sem aquele tópico a peça seria arquivada. Ainda tentando solucionar o problema, reencontrou Colère e pediu para que o mesmo retirasse o garoto do hospital. O vermelho, com a ajuda de dois policiais que o acompanhava, escoltou o corpo do menino para fora da cidade. Com a presença oficial da guarda, os médicos e enfermeiros nada puderam fazer para impedir a retirada do comatoso. Os policiais estavam mais preocupados em se livrarem do problema, a presença de estrangeiros sempre lhes causavam transtornos, do que com a saúde do rapaz. 

Sozinho com Ravi, Colère, com auxílio do tapete voador, se dirigiu à aldeia do Povo do Maracujá. Para Bleu, aqueles homens tão semelhantes ao menino, poderiam salvá-lo. Enquanto isso, o azul aguardou o retorno de Giallo. Quando o amarelo retornou, os dois trataram de escrever o tópico faltante da petição.

"Já sei Bleu. Vamos falar sobre as Criaturas Negras. Escreva que o menino encontrou uma dela nas imediações da cidade. Que em breve esta criatura tentará nos atacar. Escreva também que Ravi possui uma flauta mágica, desenvolvida pelo povo monstruoso, capaz, caso tocada da forma correta, de adormecer qualquer um da espécie. Coloque aí que apenas o menino sabe manejar o instrumento, e que a presença dele é a única solução para nos livrarmos do ataque da criatura."

"Isso é absurdo. Além de não ser verdade, dificilmente eles irão acreditar nesta fantasia. Todos sabem que as Criaturas Negras foram extintas."

"Eles acreditarão. Nós temos a flauta. Eles farão uma perícia e, quando constatarem que trata-se de uma flauta das Criaturas Negras, ficarão com tanto medo que certamente irão nos dar ouvidos. Ravi, receberá a máscara, ficará uns tempos com o Senhor Green, e quando todos se esquecerem do assunto, ele poderá voltar pra casa."

Em desalentos, Bleu redigiu o tópico. Não acreditava no sucesso daquelas espúrias argumentações. Giallo, contudo, estava muito contente; seu plano ia ganhando corpo, e seus problemas se rearranjando. O amarelo tinha imenso talento para solucionar entraves a curto prazo. Mas a sua forma de lhe dar com os obstáculos era insanamente temerária; superava conflitos pegando atalhos tão perigosos que sem perceber criava situações árduas, procelosas. 

Para se livrar de uma dívida com o Senhor Green, produziu aquela série de eventos muito mais complexos. Se antes tinha um probleminha a resolver, agora teria de enfrentar algo gigantesco. Criou tantos empecilhos com suas falácias que dificilmente conseguiria resolver tudo e sair ileso. Apesar disso, não atinava para o tamanho da encrenca que estava se metendo, e quando mais inventava estórias, maior era o seu ânimo para continuar a mentir. 

Partiram para o palácio real e juntos com Amertume foram ao encontro dos três ministros. Dois deles eram roxos, o terceiro violeta. Cada qual comungava com um estilo filosófico único. O mais velho, com a cabeça quase tão grande quanto a do Senhor Green, tinha uma posição moderada e geralmente servia de balança entre os outros dois. O violeta era conservador, e dificilmente daria provimento em favor de um estrangeiro. O outro roxo, o mais jovem dos três, estava conectado com as teses progressistas; seria o caminho mais seguro para galgarem sucesso. Giallo sabia do posicionamento ideológico dos ministros; não se preocupava com o violeta e com o mais jovem, suas atenções se voltariam exclusivamente ao ministro ancião. O seu voto seria o mais importante, desempataria as divergências dos outros dois. Sabendo disso, teria que incutir medo no magistrado, convencendo-o que apenas o garoto poderia salvar a cidade de um iminente ataque.

FG

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Camões vs. Gonçalves Dias - um duelo aos olhos verdes

Redondilha de Camões Menina dos olhos verdes Por que me não vedes? Eles verdes são, E têm por usança Na cor esperança E nas obras não Vossa condição Não é de olhos verdes, Porque me não vedes. Isenção a molhos Que eles dizem terdes, Não são de olhos verdes, Nem de verdes olhos. Sirvo de geolhos, E vós não me credes, Porque me não vedes. Havia de ser, Por que possa vê-los, Que uns olhos tão belos Não se hão de esconder. Mas fazeis-me crer Que já não são verdes, Porque me não vedes. Verdes não o são No que alcanço deles; Verdes são aqueles Que esperança dão. Se na condição Está serem verdes, Por que me não vedes? (poema retirado do livro Lírica Redondilhas e Sonetos de Camões da editora Ediouro) Olhos Verdes de Gonçalves Dias São uns olhos verdes, verdes, Uns olhos de verde-mar, Quando o tempo vai bonança; Uns olhos cor de esperança Uns olhos por que morri; Que, ai de mi! Nem já sei qual

Carta de Despedida

Sentir? Sinta quem lê! Fernando Pessoa Quando alguém ler estas palavras já estarei morto. Não foi por impulso, refleti muito, ao tomar esta decisão; percebi que o melhor não seria viver, mas desistir. Venho, através desta carta, me despedir de algumas pessoas; tenho, antes de tudo, a responsabilidade de amenizar a dor, causada por esta autônoma escolha, que infelizmente afligirá quem não a merece. Cansei de ser covarde, ao menos nesta derradeira atitude assumirei a postura obstinada e corajosa dos homens de fibra; não será por medo e nem por desesperança do futuro que abdicarei da existência, são razões bem mais simplórias que me autorizaram a colocar em prática resoluta solução; na verdade, talvez não exista razão alguma, esta será uma decisão como qualquer outra, e, portanto, será oriunda da mais depurada liberdade de meu espírito. Não quero responsabilizar ninguém, pois apenas eu, sem nenhuma influência exterior, escolhi por um ponto final nesta frase mal escrita

Narrativa Erótica

Um homem cansado fumava seu cigarro refestelado ao sofá, ouvia um pouco de jazz e não pensava em nada; Miles Davis, o inigualável músico americano, preparava seu organismo para uma vindoura noite de prazer. A atmosfera era cálida, desaconselhava as formalidades de qualquer andrajo ou vestimenta; em uma espécie de convite, o calor exortava-o à nudez. Não era belo, tampouco repugnante, tinha alguns atrativos capazes de seduzir mulheres mais liberais, apesar de magro possuía um corpo atlético, bem definido. Três baganas já pendiam sobre o cinzeiro, sua vitrola sibilava o ar com um doce almíscar sonoro de Blue in Green, criando um clima perfeito para possíveis relaxamentos sexuais . D e olhos fechados, aguardava, dentro de uma tranquilidade incomum, ansioso e apoplético; seus movimentos eram delicados, sincronizados, quase poéticos; levava o cigarro à comissura dos lábios, inspirava a fumaça para depois soltá-la, tentando criar figuras mágicas, inebriadas pela falta de pudor. A s