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Mostrando postagens de 2016

Thérèse Raquin - Émile Zola

Thérèse Raquin foi o primeiro romance publicado pelo naturalista francês Émile Zola no ano de 1867. Narra a estória da personagem título e seu drama afetivo envolvendo o marido, Camille, e o amante, Laurent. Zola tentou escrever uma pútrida trama de amor em que este nobre sentimento romântico fosse analisado com um olhar minucioso e científico. Não à toa pontua, no prefácio escrito em resposta aos críticos, o seguinte esclarecimento: "Thérèse e Laurent são animais humanos, nada mais. Procurei acompanhar nestes animais o trabalho surdo das paixões, as violências do instinto, os desequilíbrios cerebrais ocorridos na sequência de uma crise nervosa. Os amores dos meus dois herois são a satisfação de uma necessidade; o crime que cometem é uma consequência do adultério, consequência que aceitam como os lobos aceitam o assassinato dos cordeiros; enfim, o que eu me vi obrigado a chamar de remorso consiste numa simples desordem orgânica, numa rebelião do sistema nervoso tenso a

Pier Paolo Pasolini

A raiva (...) Por que não reajo, por que não tremo de alegria ou gozo de pura angústia? Por que não sei reconhecer este antigo nó de minha existência? Eu sei: porque em mim já se fechou o demônio da raiva. Um surdo, fosco, minúsculo sentimento que me envenena; esgotamento, dizem, febril impaciência dos nervos: mas já não se liberta a consciência. A dor que pouco a pouco de mim me aliena,  se me abandono apenas,  desprende-se de mim, rodopia independente,  pulsa desgovernada em minhas têmporas, me enche o coração de pus, e já não sou mais dono de meu tempo... Nada, antes, poderia me vencer. Eu me encerrara em minha vida como no ventre materno, neste ardente cheiro de rosa humilde e molhada. Mas lutava por sair, lá na província campestre, poeta aos vinte, sempre,  sempre a sofrer desesperadamente, desesperadamente a exultar... A luta acabou em vitória. Minha existência privada já não se encerra entre as pétalas duma rosa

Leituras de Maio

Coração Tão Branco - Javier Marías  O livro, narrado em primeira pessoa, conta a história de Juan, um tradutor intérprete que labora nos mais importantes eventos internacionais. A personagem abre seu relato descrevendo, com minúcias de detalhes, o suicídio da tia, que à época era casada com seu futuro pai. Esta tragédia familiar, por muito tempo mantida em segredo e longe dos olhos e ouvidos de Juan, persegue o narrador mesmo antes dos fatos se tornarem inteligíveis à sua memória, já que seu pai, homem afável, sedutor e estranhamente misterioso, ostentava a terceira viuvez; e ele, Juan, experimentava as incertezas e inseguranças de seu recente casamento com Luísa.  O livro apresenta grande requinte técnico, com frases longuíssimas, muitas vezes intermináveis, além de outros recursos extremamente bem trabalhados, como a sobreposição de falas e pensamento, atitudes e reflexões, discurso e suas interpretações. O título é uma referência a Macbeth, peça de Shakespeare. &q

Julgamento do Mérito

Certa manhã 4 indivíduos encontraram-se para discutir algo sobre o mérito. O líder, aquele que ocupava a cadeira mais alta da sala de reuniões, quase não falava; apenas perscrutava todos os outros, ora com olhar jocoso, outras vezes insinuando desprezo. Dos outros três, dois se enfrentavam verbalmente minuto a minuto, estavam em lados opostos da sala, e defendiam interesses distintos; o estranho é que argumentavam sobre vida alheia e supostas regras que comprovariam suas versões e verdades. O quarto indivíduo, sempre silente e talvez o menos importante, era, se não fosse seu semblante apreensivo e desesperado, mero elemento figurativo; no entanto, os dois que falavam, se referiam a ele, suas emoções, pensamentos, ideias, atitudes, comportamento, cotidiano; a vida do indivíduo calado e menos importante era analisada nos mínimos detalhes; dos que falavam, um parecia defendê-lo, apontando suas fraquezas e fealdades, o outro o acusava, ressaltando sua astúcia e qualidades. A dis

A Fábula do Mentecapto

- Conheces a Antuérpia? Cidade das mais belas. Tive o prazer de conhecer Miller; nosso jovem e magistral escritor Henry Miller, naquele paraíso belga - disse o pequeno mentecapto antes de tragar sua cigarrilha. - Miller!? Ele já esteve na Antuérpia!? Lembro-me de ter conversado sobre viagens com ele. Se me recordo, jurou de pé junto que nunca esteve lá. Aliás, na ocasião me pediu descrições detalhadas dos flandres para poder incluir na primeira edição do "Trópico de Câncer". Relatei os mínimos detalhes daquele lugar paradisíaco; as gôndolas, as mulheres, os artistas - respondeu o grande mentecapto, bebericando chistoso sua dose de whisky. - Talvez tenha me enganado, mas não me lembro de nenhuma gôndola quando estive na Antuérpia. - Só as melhores, mais ornamentadas e perfeitas da Europa. - Andaste em alguma delas? - Nunca estive na Antuérpia. - Ora! Então como a descreveu ao nosso amigo escritor? - Imaginei, meu querido; apenas imaginei. A A